CASO CLÍNICO
R e v i s t a C i e n t í c a d a O r d e m d o s M é d i c o s w w w. a c t a m e d i c a p o r t u g u e s a . c o m
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Gravidez Gemelar com uma Mola Hidatiforme
Completa e um Co-Gémeo Viável
Twin Pregnancy with a Complete Hydatiform Mole and a Viable Co-Twin
1. Departamento de Obstetrícia, Ginecologia e Medicina da Reprodução. Hospital de Santa Maria. Centro Hospitalar Lisboa Norte. Lisboa. Portugal.
2. Unidade de Ecograa. Departamento de Obstetrícia, Ginecologia e Medicina da Reprodução. Hospital de Santa Maria. Centro Hospitalar Lisboa Norte. Lisboa. Portugal.
Recebido: 30 de Janeiro de 2013 - Aceite: 24 de Agosto de 2013 | Copyright © Ordem dos Médicos 2014
Ana Beatriz GODINHO
1
, Diana MARTINS
1
, Cláudia ARAÚJO
1
, Maria Antonieta MELO
2
, Luís MENDES GRAÇA
1
Acta Med Port 2014 Jan-Feb;27(1):135-137
RESUMO
A existência de uma gravidez gemelar bicoriónica com uma mola hidatiforme completa e um co-gémeo viável é um evento raro, sendo
o diagnóstico habitualmente realizado no segundo trimestre. Pode associar-se a tirotoxicose, pré-eclâmpsia, hemorragia vaginal,
doença persistente do trofoblasto e morte fetal. Os autores descrevem o caso de uma grávida com hemorragia do primeiro trimestre.
As imagens ecográcas foram interpretadas como uma gravidez gemelar bicoriónica com um embrião vivo e outra placenta com
imagem de descolamento. Às 16 semanas visualizou-se um feto vivo com placenta posterior e uma massa vacuolada anterior, vas-
cularizada. Perante a hipótese de doença do trofoblasto o casal optou pela interrupção da gravidez. O exame anatomo-patológico
conrmou o diagnóstico. Perante a raridade desta entidade clínica, é necessário um elevado índice de suspeição para estabelecer o
seu diagnóstico ecográco. Apesar de estarem descritos casos com um bom desfecho materno e neonatal, a decisão de continuação
da gravidez deve ser tomada pelos progenitores.
Palavras-chave: Doenças em Gémeos; Gravidez Gemelar; Mola Hidatiforme; Ultrassonograa.
ABSTRACT
A complete hydatiform mole coexisting with a live, viable twin is a rare event. The diagnosis is challenging, and is normally achieved
only at second trimester. It may be associated with thyrotoxicosis, vaginal bleeding, preeclampsia, fetal death or persistent thropho-
blastic disease. The authors describe the case of a pregnant woman presenting with rst trimester bleeding. Ultrasound revealed a
twin pregnancy with a viable twin and another placenta apparently detached. At 16 gestational weeks ultrasound revealed a live fetus
with a normal placenta and a separate vacuolated and vascularized mass. Facing the hypothesis of gestational trophoblastic disease,
the couple chose pregnancy interruption. Given the rarity of this situation, a high index of suspicion is needed to achieve the diagnosis.
Despite the existence of case reports with good fetal and maternal outcome, the decision of pregnancy continuation should be made
by the informed parents.
Keywords: Diseases in Twins; Hydatidiform Mole; Pregnancy, Twin; Ultrasonography.
INTRODUÇÃO
A doença trofoblástica gestacional dene-se como uma
doença proliferativa das células do trofoblasto resultantes
de um processo de fertilização aberrante. As doenças do
trofoblasto mais frequentes são a mola hidatiforme comple-
ta, caracterizada por edema generalizado do tecido vilositá-
rio, hiperplasia trofoblástica difusa, sem tecido embrionário
presente, e a mola hidatiforme parcial, caracterizada por
alterações placentárias hidatiformes focais e presença de
embrião, habitualmente triplóide, com múltiplas malforma-
ções.
1
Estima-se que a incidência de mola hidatiforme seja
de 1 para 1 000, embora se veriquem diferenças geográ-
cas importantes, com uma maior incidência nos países
asiáticos e da América do Sul.
1
Esta patologia é conside-
rada pré-maligna, pelo que a interrupção da gravidez é a
regra assim que se estabelece o diagnóstico.
A mola hidatiforme completa está associada a várias
complicações maternas, como a tirotoxicose, hiperemese
gravídica, quistos bilaterais dos ovários, pré-eclâmpsia pre-
coce, eclâmpsia, hemorragia vaginal e doença persistente
do trofoblasto.
2,3
Associa-se também a morte fetal.
2,3
A existência de uma gravidez gemelar bicoriónica, em
que coexiste uma mola hidatiforme completa com um gé-
meo viável, é um evento raro, estimando-se a sua incidên-
cia em 1:20 000 a 1:100 000.
2
O primeiro caso descrito na
literatura remonta a 1952,
4
e desde então têm sido publi-
cados casos clínicos isolados
5-7
e algumas séries de ca-
sos.
2,3,8
Os autores apresentam o caso de uma gravidez geme-
lar bicoriónica com uma mola hidatiforme completa e um
co-gémeo viável.
CASO CLÍNICO
Primípara saudável, de 31 anos, grupo sanguíneo
ARh+. Iniciou hemorragia vaginal escassa às nove sema-
nas de gravidez, sem outros sintomas associados. As ima-
gens ecográcas sugeriam gravidez gemelar bicoriónica
com um embrião vivo e uma outra placenta com imagem
sugestiva de descolamento (Fig. 1) mas sem saco am-
niótico nem embrião. Às 12 semanas mantinha hemorra-
gia vaginal escassa, e a ecograa mostrava um feto vivo
de morfologia normal, com os marcadores ecográcos de
aneuploidias negativos e com placenta posterior, e uma
imagem sugestiva de descolamento placentário junto ao
orifício interno do colo (Fig. 2).
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